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A Cientificidade do Trabalho de Allan Kardec

  • Foto do escritor: IPCE
    IPCE
  • 7 de fev. de 2021
  • 25 min de leitura

Mauricio Mendonça, 2020

Nesse artigo abordaremos a questão da cientificidade do trabalho de Allan Kardec dividindo didaticamente em duas partes. Na primeira apresentaremos o trabalho de Kardec enquanto pesquisador científico prático, demonstrando que compreendia e executou os procedimentos metodológicos da ciência de sua época e que em muitos casos, foi mais além dessa compreensão. Na segunda parte, abordaremos a capacidade especial de Kardec para compreender aspectos teórico-metodológicos que ainda não estavam sistematizados à sua época, analisando a sua produção sob à luz do trabalho filosófico de Thomas Kuhn sobre os conceitos das revoluções paradigmáticas. Reconhecendo, entretanto, que também é possível construir análises sofisticadas com outras formas modernas de se compreender o que é fazer ciência. No final desse artigo tentaremos responder, com base nas explanações, a intrigante pergunta: “O trabalho de Allan Kardec pode ser considerado autenticamente científico?”


A Ciência no Tempo de Kardec

Empirismo, Indutivismo e Positivismo

À época de Kardec, imperava nos meios acadêmicos a corrente filosófica do positivismo, que foi derivado do empirismo e do indutivismo, que naturalmente exercia influência sobre o seu pensamento e forma de trabalhar cientificamente. Segundo o empirismo de Jonh Locke (1632-1704) nascemos com um cérebro “vazio”, que recolhe passivamente as informações recebidas pelos órgãos dos sentidos, isto é, todo o conhecimento provém das experiências sensoriais. Outros conhecimentos podem ser elaborados internamente através de associações, porém esse novo conhecimento seria menos seguro, pois não provém da experiência diretamente. O indutivismo, representado por Francis Bacon (1561-1626), considerado o pai do método experimental, apresentou o método indutivo que partia da observação dos fatos e que através do raciocínio indutivo, elaborava um conhecimento considerado científico.

Para Gabriel Delanne, “O sábio Bacon recomendou, antes de tudo, a ordem e a classificação nas pesquisas: quis que a filosofia saísse de seus antigos limites; abriu um campo novo às investigações e sugeriu a observação como o mais seguro meio de se chegar à verdade” (DELANNE,1885).

Posteriormente, surgiu a ideia do positivismo, cujo idealizador, o filósofo Augusto Comte (1798-1857), defendia a ideia de que o conhecimento científico é a única forma de conhecimento verdadeiro. Segundo os positivistas somente pode-se afirmar que uma teoria é correta se ela for comprovada através de metodologia científica. Também não consideravam como conhecimento válido aqueles ligados a crenças, superstição ou qualquer outro que não possa ser comprovado cientificamente.

O Materialismo Positivista

Segundo Delanne, “O positivismo de Augusto Comte teve o mérito de opor à imaginação – realmente muito errante dos seus predecessores – as frias e rígidas doutrinas da tradição baconiana. Comte procurou reanimar o sensualismo, aplicando-lhe a ideia do progresso, mas faliu em sua tentativa e foi forçado, depois de tentar explicar tudo pela experiência e pela observação, a reconhecer que existe em nós uma faculdade: o sentimento, que não pode ser ignorado impunemente” (DELANNE,1885).

A partir daí foi se consolidando as bases do materialismo positivista, como podemos ver no prefácio do livro de Leblais (1865) sobre o materialismo: “O físico reconhece que a matéria pesa; o fisiologista, que a substância nervosa pensa; sem que um ou outro tenha a pretensão de explicar por que uma pesa e a outra pensa”. Delanne considera que “Daí termos razão no dizer que os positivistas não passam de materialistas disfarçados” (LEBLAIS, 1865).

Nesse sentido, o positivismo desaguou no Materialismo Reducionista, cujo pensamento “sustenta que a única coisa da qual se pode afirmar a existência é a matéria; que, fundamentalmente, todas as coisas são compostas de matéria e todos os fenômenos são o resultado de interações materiais; que a matéria é a única substância (wikipedia).


Kardec e o positivismo

Allan Kardec demonstrou, em várias oportunidades, que conhecia perfeitamente toda a problemática que envolvia a pesquisa dos fenômenos espíritas e procurou agir atendendo os critérios da ciência sua contemporânea que, como vimos, era explicada predominantemente pela ótica da filosofia positivista. O memorável fundador do espiritismo defendia que a proto ciência que ora propunha utilizava os mesmos procedimentos das “Ciências Positivas”. Escreveu Kardec:

As ciências só fizeram progressos importantes depois que os estudos se debruçaram sobre o método experimental. ... Até o presente, o estudo do princípio espiritual, compreendido na Metafísica, foi puramente especulativo e teórico. No Espiritismo, esse estudo é inteiramente experimental. Com o auxílio da faculdade mediúnica, mais desenvolvida presentemente e, sobretudo, generalizada e mais bem estudada, o homem se achou de posse de um novo instrumento de observação. ... O Espiritismo e a Ciência completam-se reciprocamente; a Ciência, sem o Espiritismo, acha-se na impossibilidade de explicar certos fenômenos só pelas leis da matéria; ao Espiritismo, sem a Ciência, faltariam apoio e comprovação. (KARDEC,1868)

Naquele contexto histórico e social qualquer um que pretendesse ser considerado cientista teria que esposar-se em grande parte dos preceitos do positivismo, Kardec não fugiu à regra. Apesar de muitos dos seus cadernos de pesquisa contendo comunicações de médiuns do seu grupo, de outros grupos de pesquisadores e anotações de suas próprias observações permanecerem desaparecidos (SAMPAIO, 2014), é possível demonstrar a faceta de pesquisador e cientista prático de Allan Kardec. Entretanto, como ficará demonstrado no desenvolvimento desse artigo, ele não se limitou a essa fronteira do conhecimento; sua capacidade intelectiva o levou a criar e utilizar ferramentas filosóficas e metodologias cientificas que só foram desenvolvidas em meados do século XX. Jáder Sampaio, pondera por exemplo, que para investigar uma realidade inacessível por experimentações empíricas, Kardec empregou técnicas discutidas na construção de uma ciência hermenêutica de Schleiermarcher (1738-1834) e na fenomenologia de Edmund Husserl (1859-1938) (SAMPAIO, 2014).


As Mesas Girantes

Mesmo não havendo registros apontando que Kardec tenha por si mesmo conduzido alguma pesquisa do fenômeno das mesas girantes, sabemos que ele participou como convidado de algumas seções de demonstração, ocasiões em que fez observações criteriosas sobre o fenômeno em primeira mão, e que isso foi o gatilho para suas futuras pesquisas mediúnicas. A seguir, temos a transcrição de um trecho da dissertação de mestrado de Marcelo Gulão (2014), que esclarece esse fato:

Em 1854, Rivail tomou ciência do fenômeno das mesas girantes por meio de um amigo de longa data, o magnetizador Auguste Fortier. Na primeira conversa, Fortier teria relatado as manifestações como uma nova característica do fluido magnético, que poderia magnetizar a mesa e movê-la de acordo com a vontade, sem qualquer força física. Rivail recebeu a notícia com desinteresse. Para ele, causas físicas como o magnetismo e a eletricidade poderiam explicar o fenômeno (KARDEC, 1890/1924).

Meses depois, Fortier teria narrado uma nova descoberta: as mesas respondiam a perguntas realizadas pelos assistentes (KARDEC, 1890/1924). Rivail afirmou então que esse fato era inexplicado, contrário às leis naturais. Tal relato gerou-lhe uma reação cética: “Só acreditarei quando o vir e quando me provarem que uma mesa tem cérebro para pensar, nervos para sentir e que possa tornar-se sonâmbula. Até lá, permita que eu não veja no caso mais do que um conto para fazer-nos dormir em pé” (KARDEC, 1890/1924).

Em 1855, Rivail recebeu novas notícias das manifestações por meio de um amigo, Sr. Carlotti, em que se relatou pela primeira vez da intervenção dos espíritos nas sessões. O entusiasmo do depoimento de Carlotti teria aumentado a desconfiança de Rivail (KARDEC, 1890/1924). Depois de algum tempo, no mesmo ano, Rivail relatou o encontro com o Sr. Pâtier, funcionário público, que pela sua grande instrução, caráter grave, calma e frieza convenceu Rivail a assistir uma sessão mediúnica (KARDEC, 1890/1926). Nessa sessão, observou os fenômenos das mesas girantes e o que chamou mais tarde de “ensaios imperfeitos da escrita mediúnica”, referindo-se à atividade dos médiuns utilizando uma cesta com um lápis apropriado, fixado no fundo, com a ponta para fora, sobre uma ardósia, chamada de cesta-pião (KARDEC, 1890/1924).

As pesquisas com as Irmãs Baudin

Após a tal sessão mediúnica, Rivail teria decidido iniciar uma investigação aprofundada dos fenômenos. Frequentou regularmente sessões mediúnicas com médiuns desconhecidos um dos outros; dentre eles destacaram-se as irmãs Baudin e Celine Japhet (KARDEC, 1858b; KARDEC, 1890).

As irmãs Caroline e Julie Baudin, à época com 16 e 14 anos, respectivamente, estabeleciam a comunicação mediúnica também por intermédio da cesta-pião, que funcionava com o apoio simultâneo das duas irmãs. Desta feita, assistindo as duas médiuns em atividade, Rivail teria observado a escrita contínua de mensagens atribuídas aos espíritos e os diálogos em que os supostos espíritos respondiam às perguntas dos assistentes, algumas feitas mentalmente, nas concorridas sessões na casa da família Baudin (KARDEC, 1890/1924,p. 208). No ano seguinte, observou as sessões dirigidas por Roustan, magnetizador, e a sonâmbula Celine Japhet, onde se utilizava um método de escrita mediúnica mais eficaz do que a cesta-pião, chamada cesta de bico (KARDEC, 1890/1924, p. 211).

Rivail, nessa experiência de observação, afirmou que se viu diante de um fenômeno inexplicado (1890/1924). Rejeitando explicações sobrenaturais e milagrosas, ele entendia que cada fenômeno deveria ter uma causa natural suscetível de investigação científica (KARDEC, 1857).

Allan Kardec em sua obra espírita analisou as principais hipóteses explicativas levantadas na época por diversos pesquisadores para os fenômenos que ele observara.

Os Possessos de Morzine

No ano de 1857 ocorreram uma série de transtornos psíquicos e convulsões corporais envolvendo os moradores da comuna de Morzine, na França.

Resumo do caso: mulheres relatavam ter visões da Virgem Maria, que evoluíam para convulsões e blasfêmias contra a eucaristia durante as crises (ARTHAUD, 1862). A comunidade local atribuiu o fenômeno à possessão demoníaca e essas mulheres foram submetidas a sessões de exorcismo com o abade Pinget (RICHARD, 2011). Mesmo com o sucesso dos exorcismos num primeiro momento, os casos de ‘possessão’ se multiplicaram até 1861 (CONSTANS, 1863) ao ponto de somar 200 casos, que correspondia aproximadamente a 10% da população da cidade. Agentes de saúde foram enviados para avaliar o problema e tomar as medidas necessárias. Entre eles, destaca-se o Dr. Augustin Constans, inspetor-geral dos asilos de alienados, que visitou a região para realizar uma investigação epidemiológica no local onde ocorriam os casos (CONSTANS, 1863).

Segundo o diagnóstico do Dr. Constant, os habitantes de Morzine sofriam de uma monomania epidêmica, a histero-demonopatia (ARTHAUD, 1863; CONSTANS, 1863). Essa patologia era definida como uma variedade de alienação mental que consiste em supor-se possuído do demônio (LARROUSSE, 1867). Os sintomas decorreriam do isolamento em que vivia essa pequena comunidade, localizada em uma área pobre, montanhosa e de difícil acesso. A região teria condições climáticas insalubres e a população vivia malnutrida, contribuindo para a epidemia (CONSTANS, 1863). Além das condições socioeconômicas e geográficas, o forte vínculo dos moradores com o catolicismo seria um segundo fator determinante da epidemia, por viverem num clima religioso de excessiva severidade. De acordo com o inquérito, as tentativas de exorcismo apenas teriam aumentado o mal (CONSTANS, 1863).

Como tratamento, Dr. Constans adotou medidas repressivas para acabar com a epidemia, mantendo tropas na praça da comuna, proibindo reuniões e dispersando os doentes para hospitais de diversas regiões, principalmente asilos de loucos. Ele acreditava que as duchas seriam um tratamento eficaz para esses casos (CUCHET, 2012, pp. 161-2). Suas medidas deram resultado e ele pediu a substituição, em abril de 1861, do abade Pinget e de algumas autoridades do governo local, atribuindo-lhes a expansão da doença devido suas práticas religiosas excessivas (CONTANS, 1863).


Vejamos a continuação da transcrição de partes da dissertação de mestrado do Marcelo Gulão (GULÃO, 2014):

Allan Kardec tomou conhecimento do fenômeno em março de 1862, através de um de seus correspondentes, o capitão Blondin (KARDEC, 1862c). A carta veio acompanhada de uma brochura publicada por um dos médicos da comissão e por informações do Dr. Caille, o encarregado do ministro de acompanhar o inquérito do Dr. Augustin Constans, inspetor das casas de alienados (KARDEC, 1862c).

Durante um ano, Kardec realizou uma pesquisa abrangente sobre os casos de possessão. Nesse período, buscou evocar espíritos por diferentes médiuns, perguntando-lhes sobre o tema (KARDEC, 1862c); promoveu estudos com os membros da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas (KARDEC, 1862c; 1862d); analisou casos semelhantes registrados na história (KARDEC,1862c; 1862d; 1863c; 1863d); ponderou casos parecidos enviados por seus correspondentes vindos de diferentes lugares (KARDEC, 1862d; 1863c; 1863d); analisou artigos publicados na imprensa sobre a possessão em Morzine (KARDEC, 1863e); leu diversos relatórios oficiais e acadêmicos sobre a epidemia de possessão (KARDEC, 1862c; 1863e); observou casos de possessão isolados em várias localidades (KARDEC, 1862e); e realizou uma viagem de campo para Morzine objetivando avaliar os casos de possessão (KARDEC, 1862e;1863e).

Com base em sua pesquisa, nos relatórios médicos do Dr. Joseph Arthaud e do Dr. César Chiara e nas observações realizadas em sua visita à região, Kardec publicou, em fevereiro e abril de 1863, dois artigos criticando as ações do Dr. Constans, tanto em seu diagnóstico quanto na forma como tratou da epidemia.

O relatório de Constans foi criticado por Kardec em diversos pontos: as condições de insalubridade do clima e o fato de a população ser desnutrida não encontrariam respaldo em suas observações e em outros relatórios médicos (KARDEC, 1863d; 1863e; 1863f; ARTHAUD, 1862; CHIARA, 1861), e se tais fatores fossem determinantes da epidemia, a possessão deveria ser igualmente observada em outras regiões com as mesmas características, o que não se verificava (KARDEC, 1863e).

Outra crítica observada era sobre o relatório do Dr. Constans ter ignorado uma variedade de características dos indivíduos quando em estado de possessão. Kardec mencionou uma série delas:

- Os pacientes se diziam controlados por um poder externo a eles, afirmando serem atormentados por seres invisíveis (KARDEC, 1863d). Durante as crises, os doentes faziam referência de si mesmos na terceira pessoa, com a constante manifestação da personalidade afirmando ser o demônio. (KARDEC,1863e);


- Entre os intervalos dos episódios de possessão, os pacientes tinham um comportamento normal e durante as crises o batimento cardíaco não era alterado, apesar da intensa agitação provocada pelas crises. No decorrer delas, havia intensa oposição à religião, o que não se observava em sua convivência diária (KARDEC,1863e);

- Os episódios de possessão também geravam a aquisição de novas habilidades, como crianças que se tornariam fluentes em idiomas como o francês e o alemão (KARDEC, 1863e). Os “possessos” relatariam eventos ocorridos simultaneamente em regiões distantes, ainda que eles nunca tivessem saído de sua região. Alguns adquiriam a habilidade de ler a mente de outras pessoas. Após a crise, os doentes alegavam não recordar sobre o que disseram e fizeram durante a crise (KARDEC,1863e).


A principal crítica de Kardec ao trabalho do Dr. Constans seria a avaliação apressada que ele tinha feito dos relatos, relegando-os à superstição devido ao excesso de religiosidade dos habitantes (KARDEC, 1863d). Embora fatores supersticiosos amplificassem os relatos sobre as crises, Kardec (1863e) apontava que o preconceito era o pior inimigo do observador, criticando a inflexibilidade das ideias do Dr. Constans em analisar esses fenômenos: “Dizemos simplesmente que, com sua ideia preconcebida não viu senão o que queria ver, passo que, se ao menos tivesse admitido a possibilidade de outra causa, teria visto outra coisa”(KARDEC, 1863f).

Para Kardec, os possessos seriam médiuns inconscientes subjugados pela obsessão de espíritos. Ele observou que os possessos, muitas vezes, teriam consciência daquilo que faziam, mas seriam, na realidade, subjugados, obrigados “a fazê-lo, como se um homem mais vigoroso que ele o constrangesse, contra sua vontade, a mover os braços, as pernas, a língua” (KARDEC, 1862d). O processo se daria através da ação do perispírito do obsessor que recobriria o perispírito do indivíduo obsediado como um manto, levando-o a uma espécie de catalepsia moral, transformando-o em um instrumento cego de sua vontade (KARDEC, 1862d).

A possessão, de acordo com Kardec, poderia tomar a aparência do que foi chamado de loucura obsessiva, a qual se distinguiria da loucura patológica por não ser fruto de uma alteração dos órgãos e por não ser tratada através dos medicamentos tradicionais (KARDEC, 1862c). A epidemia de Morzine seria “uma epidemia moral”, pois não se trataria de uma doença do corpo, mas sim uma influência espiritual (KARDEC, 1862c).


A Revista Espírita

“Realizar e compartilhar pesquisas são alguns dos objetivos centrais da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas – SPEE e para comunicar os resultados obtidos e ampliar o contato com grupos de outras localidades, Kardec criou e manteve ativa a Revista Espírita. Ele deu grande importância à manutenção da correspondência entre grupos sérios, provavelmente porque sabia que iria ampliar seu acervo para pesquisas.” (SAMPAIO, 2014).

Os exemplos mostrados acima demonstram assertivamente que Kardec agiu dentro do que se espera de um autêntico pesquisador científico, tanto à sua época quanto para os tempos atuais. A seguir, veremos como ele se relacionou com a metodologia filosófica e aspectos teóricos da epistemologia.


Aprimoramento da técnica e instrumentos

“A cesta de bico consiste em adaptar uma haste inclinada, de madeira, em posição semelhante à dos mastros que, num veleiro, lançam-se do bico da proa para frente. Por um buraco aberto na ponta dessa haste, passa-se um lápis bastante comprido. Para que sua ponta assente no papel. o médium põe os dedos sobre a borda, o aparelho todo se agita e o lápis escreve; o médium pode levar o lápis de uma linha a outra com mais facilidade. Obtém-se, assim, dissertações de muitas páginas, tão rapidamente como se fossem escritas com a mão.” (KARDEC, 1857)

Cuidados metodológicos

Para elaboração da análise dos conteúdos das mensagens e, a partir daí, decidir quais delas eram dignas de créditos, método conhecido como CUEE (Controle Universal dos Ensinos dos Espíritos) Kardec faz referências explicitas à comunicações provenientes de 37 países e de 4 continentes: 18 da Europa; 8 da América; 5 da África e 6 da Ásia; totalizando 268 cidades. Kardec analisa com bom senso o conteúdo (A lógica e a melhor adequação da comunicação aos fenômenos observados).


Análise das hipóteses alternativas


Allan Kardec analisou as principais hipóteses explicativas levantadas na época por diversos pesquisadores para os fenômenos que observara.

De acordo com Marcelo Gulão, em sua tese, Kardec analisou duas hipóteses de charlatanismo: truques de prestidigitação e músculos estalantes. Identificou que muitas das supostas manifestações mediúnicas tinham como causa a fraude, mas discordou que todas as manifestações mediúnicas fossem fruto dessa prática (KARDEC, 1861/1869). A hipótese das causas físicas, também avaliada, era a idéia de que forças físicas, conhecidas ou desconhecidas, estavam entre as causas dos controversos fenômenos. Para Kardec, a teoria era consistente para explicar os fenômenos mecânicos, como as mesas girantes, mas insuficiente em oferecer respostas para fenômenos inteligentes, como batidas que respondem a sinais inteligentes (KARDEC, 1861/1869). Outra hipótese foi a da ilusão e alucinação, onde Kardec considerava que superstição, credulidade e causas fisiológicas eram frequentemente, geradoras de alucinações relatadas como mediunidade (1859/1868). Entretanto, a alucinação, entendida como um “erro, ilusão da pessoa que crê ter percepções que realmente não possui” (KARDEC, 1858/1923, p. 13), explicaria apenas parte dos fenômenos. E, por fim, a hipótese das forças fluídicas sobre as quais Kardec argumentava que, além das ocorrências físicas, havia a demonstração da natureza inteligente das manifestações; nesse grupo, incluía-se a teoria sonambúlica e a teoria do reflexo de pensamento. E ainda antes de concluir pela hipótese dos espíritos, analisou as hipóteses demoníaca e otimista uniespírita, que também admitiam uma participação de entidades incorpóreas nas manifestações. (GULÃO,2014).


A teoria espírita

Continuemos acompanhando mais algumas considerações presentes na dissertação de Mestrado do Marcelo Gulão(2014):

Embora considerasse as teorias anteriores válidas para parte dos fenômenos mediúnicos, Kardec as criticava pelo fato de elas serem incompletas e existirem fatos que as contradiziam. A hipótese da existência de inteligências extracorpóreas, para ele, seria a mais abrangente por ser capaz de explicar o grande conjunto dos fenômenos mediúnicos observados.

A escrita mediúnica por meio da cesta-pião, observada por Kardec pela primeira vez nas sessões das irmãs Baudin, era considerada por ele um método que afastaria a possibilidade de intervenção da mente do médium, pois a escrita acontecia com dois médiuns tocando a cesta com as pontas dos dedos, ao mesmo tempo, e respondendo a questões formuladas na hora, o que indicaria uma inteligência externa como fonte da comunicação (KARDEC, 1860, p. 30; 1890/1924).

Médiuns teriam fornecido informações de espíritos desconhecidos tanto deles quanto dos membros da sessão no momento da comunicação; elas conteriam detalhes específicos cuja precisão foi posteriormente verificada (KARDEC, 1859b; 1863a).

Outra evidência levantada por Kardec para sustentar a hipótese da ação espiritual era a aquisição de habilidades pelos médiuns, durante o estado mediúnico, como: médiuns analfabetos escrevendo (KARDEC, 1861); pintar e desenhar habilmente sem nenhum treinamento prévio e sem exibir essas habilidades em suas vidas comuns (KARDEC, 1858d; 1858e); escrever poemas sem conhecimento prévio das regras de poesia e sem experiência prévia com esse tipo de arte (KARDEC, 1857); falar ou escrever corretamente em línguas que não conheciam (KARDEC, 1860c; 1861, pp. 193-8); escrever com letra semelhante à da alegada personalidade comunicante quando esta pessoa estava viva, sem o médium ter visto previamente a caligrafia do falecido (KARDEC, 1857); demonstrar características como caráter, humor e escolha de palavras relacionadas com o espírito comunicante, que eram desconhecidas dos médiuns (KARDEC, 1858f; 1859c; 1859d; 1859e).

Depois de convencer-se de que havia obtido evidências empíricas suficientes para sustentar a hipótese da sobrevivência da personalidade após a morte, Kardec afirmou estar diante de “um imenso campo aberto às nossas explorações, a chave de inúmeros fenômenos até então inexplicados.” (KARDEC, 1890/1924).




Kardec e a epistemologia

Conforme comentado anteriormente, Kardec apesar de ser um homem do século XIX, demonstrou desenvoltura para tratar e pensar temas da filosofia da ciência com bastante semelhança ao que conhecemos hoje em dia. Veremos a seguir que ele não se limitou a essa fronteira do conhecimento, e usou sua capacidade intelectiva para criar e utilizar ferramentas filosóficas e metodologias cientificas que só foram desenvolvidas em meados do século XX.

Objeto de Estudo Peculiar

A citação abaixo demonstra uma peculiaridade do objeto do novo campo de estudo, onde o próprio objeto estudado é capaz de identificar-se e até mesmo propor melhorias na metodologia e nas ferramentas utilizadas para obter o fenômeno. Outro ponto a considerar: que o “fenômeno” aparentava ter inteligência e vontade própria, e um pesquisador não pode ignorar essa informação sob pena de não compreender o fenômeno.

“O conselho foi dado simultaneamente na América, na França e em diversos outros países. Eis em que termos foi dado em Paris, a 10 de junho de 1853, a um dos mais fervorosos adeptos da doutrina e que, havia muitos anos, desde 1849, ocupava-se com a evocação dos Espíritos: “Vai buscar, no aposento ao lado, a cestinha; amarra-lhe um lápis; coloca-a sobre o papel; põe-lhe os teus dedos sobre a borda.” Alguns instantes após, a cesta entrou a mover-se e o lápis escreveu, muito legível, esta frase: “Proíbo expressamente que transmitas a quem quer que seja o que acabo de dizer. “Da próxima vez que escrever, escreverei melhor.” (KARDEC, 1957)

“Nas Ciências Naturais opera-se sobre a matéria bruta, que se manipula à vontade e quase sempre se consegue determinar os efeitos. No Espiritismo, tem-se de lidar com inteligências dotadas de liberdade e que provam, a cada instante, não estarem sujeitas aos nossos caprichos. É necessário, pois, observar, esperar os resultados e colhê-los na ocorrência.” (KARDEC, 1861)

Definição da nomenclatura

“Para se designarem coisas novas são precisos termos novos. Assim o exige a clareza da linguagem, para evitar a confusão inerente à variedade de sentidos das mesmas palavras.” (KARDEC, 1857)

A antecipação do conceito de revolução paradigmática

Antes de adentrarmos nesse tema, é importante revermos o conceito do Materialismo Reducionista, a fim de analisarmos a questão do Kardec como cientista revolucionário (na concepção de Kuhn). Vejamos:

“O Materialismo Reducionista sustenta que a única coisa da qual se pode afirmar a existência é a matéria; que, fundamentalmente, todas as coisas são compostas de matéria e todos os fenômenos são o resultado de interações materiais; que a matéria é a única substância.”(wikipedia).

O Materialismo tornou-se, por assim dizer, o padrão de cientificidade a partir do início do desenvolvimento científico, o que ocorreu nas décadas iniciais do século XX, e isso se deu porque estabeleceu melhor as prerrogativas do método, preencheu melhor os critérios epistemológicos, resolveu mais problemas teóricos e práticos, apresentou maior capacidade de predição, teve maior capacidade de defender racionalmente a sua visão de mundo, apresentou uma maior capacidade de adequar a teoria aos fatos observados. O materialismo, portanto, venceu os outros modelos do conhecimento, levando em conta a convicção da grande maioria da comunidade acadêmica e da sociedade no geral (LIMA, 2019).

Nesse ínterim, a filosofia da ciência se desenvolveu e novos conceitos foram consolidados. Segundo o epistemólogo Eduardo Lima (2019), Epistemologia é o estudo da normatividade, possibilidade e inteligibilidade do conhecimento e uso da razão. Então, quando perguntamos “O que é Ciência?” estamos fazendo uma pergunta epistemológica. Quando perguntamos “Quais são os critérios, quais são os protocolos para que um estudo possa ser considerado científico?” também é esta uma indagação epistemológica. Para Thomas Kunh, a cientificidade de um objeto de estudo se configura quando forma um paradigma. (LIMA, 2019)

Paradigmas

Nas ideias de Thomas Kuhn o conceito de “paradigma” é fundamental. Paradigmas são realizações científicas que servem de modelo para toda a pesquisa, determinando que tipos de leis e teorias são válidas, que tipos de dados são pertinentes, que problemas serão investigados, que tipo de soluções serão propostas e até mesmo como os fenômenos podem ser percebidos. Dessa forma, o paradigma, em uma certa época, funciona como uma “visão de mundo”, em grande parte controlando a forma como as pesquisas científicas são feitas. A “ciência” que se faz dentro desses limites é chamada de ciência normal. Em última instância, o novo paradigma se estabelece quando há um reconhecimento de grande parte da comunidade acadêmica.


“A Ciência enganou-se quando quis experimentar os Espíritos, como experimenta uma pilha voltaica; foi mal-sucedida como devia sê-lo, porque agiu visando uma analogia que não existe; e depois, sem ir mais longe, concluiu pela negação, juízo temerário que o tempo se encarregou de ir emendando diariamente, como já tem emendado outros; e, àqueles que o preferiram restará a vergonha do erro de se haverem levianamente pronunciado contra o poder infinito do Criador.”(Allan Kardec, 1859)

É digno de nota o fato de que Kardec não dispunha, à época, do conhecimento sistematizado dos modernos filósofos da ciência do século XX, notadamente do conceito de paradigmas que foi proposto e desenvolvido por Thomas Kuhn. Apesar disso, ele demonstra em vários pontos de seus textos que entende o conceito como, aliás, ficará demonstrado na continuidade desse estudo. Kardec afirma ter utilizado o método experimental para estudar os espíritos, ou seja, o mesmo método das “ciências positivas” do qual se utilizou até onde foi possível, tanto no que se refere à metodologia quanto aos protocolos das “ciências positivas”. Vamos observar Kardec fazendo pesquisas de campo e criticando quem pesquisou os fenômenos e não as fez (como no caso dos possessos de Morzine); também observou detalhes como alteração na letra, nas características da fala e dos trejeitos, na variação de conhecimento, etc. no caso de pessoas que serviam supostamente de intermediários para os espíritos. (Lima, 2019)


Revolução Paradigmática


Pelo fato de ainda não ter o Espiritismo adquirido direito de cidade na ciência oficial, merecerá ser condenado? Se nunca a Ciência se houvesse enganado, sua opinião nesse sentido teria grande peso na balança; infelizmente, a experiência prova o contrário. Não repeliu ela como quimeras tantas descobertas que, mais tarde, tornaram-se título de glória para os seus autores? As ciências só fizeram progressos importantes depois que seus estudos se debruçaram sobre o método experimental; até então, acreditou-se que esse método também só era aplicável à matéria, ao passo que o é também às coisas metafísicas (Allan Kardec,1859).


Até o presente, o estudo do princípio espiritual, compreendido na Metafísica, foi puramente especulativo e teórico. No Espiritismo, esse estudo é inteiramente experimental. Com o auxílio da faculdade mediúnica, mais desenvolvida presentemente e, sobretudo, generalizada e mais bem estudada, o homem se achou de posse de um novo instrumento de observação. A mediunidade foi, para o mundo espiritual, o que o telescópio foi para o mundo astral e o microscópio para o dos infinitamente pequenos. Permitiu se explorassem, estudassem, por assim dizer, de visu, as relações do mundo espiritual com o mundo corpóreo; que, no homem vivo, se destacasse do ser material o ser inteligente e que se observassem os dois a atuarem separadamente. Uma vez estabelecidas as relações com os habitantes do mundo espiritual, possível se tornou ao homem seguir a alma em sua marcha ascendente, em suas migrações, em suas transformações. Pode-se, enfim, estudar o elemento espiritual (Allan Kardec, 1868).


O filósofo Thomas Kunh observa que um paradigma não é eterno; ocasionalmente, acontecem anomalias, surgem problemas que não podem ser explicados pelas teorias estabelecidas e, então, acontecem duas coisas: o paradigma começa a ser questionado, é testado, daí esses problemas; ou é absorvido e não quebra o paradigma ou, caso contrário, se a teoria não consegue explicar o fenômeno precisa ser reformulado. Quando isso acontece o antigo modelo é deixado de lado, surgindo então uma nova forma de fazer ciência; até então era ciência extraordinária ou revolucionária, diferente da ciência normal, e se esse novo modelo é validado, e se esse modelo é aceito, então passa a ser chamado de ciência. Quando um novo paradigma é finalmente aceito, a ciência converge para um novo período de ciência normal: livros são reescritos, currículos são reformulados etc. (Lima, 2019).



Kardec, ainda que não conhecesse o conceito de paradigmas, porque não existia à época, compreendeu muito bem essas nuanças e antecipou alguns desses avanços teóricos, como mostra os trechos a seguir:


“Não repeliu ela (a ciência) como quimeras tantas descobertas que, mais tarde, se tornaram título de glória para os seus autores? Não foi devido a um parecer do nosso primeiro corpo sábio que a França se absteve da iniciativa do vapor? Quando Fulton veio ao campo de Bolonha apresentar o seu plano a Napoleão I, que confiou o exame imediato ao Instituto, não decidiu este que aquilo era uma utopia, com o que se não devia ocupar?” (Allan Kardec, 1859)

“Para se designarem coisas novas são precisos termos novos. Assim o exige a clareza da linguagem, para evitar a confusão inerente à variedade de sentidos das mesmas palavras.” (Allan Kardec,1860)

“Quando surge um fato novo, que não guarda relação com nenhuma ciência conhecida, o cientista, para estudá-lo, tem que abstrair da sua ciência e dizer a si mesmo que o que se lhe oferece constitui um estudo novo, impossível de ser feito com idéias preconcebidas.”(Allan Kardec, 1857).

“Desde que a Ciência sai da observação material dos fatos, e trata de apreciá-los e explicar, o campo está aberto às conjecturas. Cada um arquiteta o seu sistema, disposto a sustentá-lo com fervor, para fazê-lo prevalecer. ... Os fatos, eis o verdadeiro critério dos nossos juízos, o argumento sem réplica. Na ausência dos fatos, a dúvida é a opinião do homem sensato.” (Allan Kardec, 1857)

Esse trecho reflete a luta pela prevalência paradigmática e a autoridade dos fatos, que apontam para o argumento da existência das anomalias no dizer de Thomas Kunh:

“Com relação às coisas notórias, a opinião dos cientistas é, com toda razão, fidedigna, porquanto eles sabem mais e melhor do que o vulgo. Mas, no tocante a princípios novos, a coisas desconhecidas, essa opinião quase nunca é mais do que hipotética, visto que eles não se acham, menos que os outros, sujeitos a preconceitos. Direi mesmo que o cientista tem, talvez, mais preconceitos que qualquer outro, porque uma propensão natural o leva a subordinar tudo ao ponto de vista donde mais aprofundou os seus conhecimentos: o matemático não vê prova senão numa demonstração algébrica, o químico refere tudo à ação dos elementos etc. Aquele que se fez especialista prende todas as suas idéias à especialidade que adotou. Tirai-o daí e o vereis quase sempre desarrazoar, por querer submeter tudo ao mesmo cadinho: consequência da fraqueza humana. As ciências ordinárias assentam-se nas propriedades da matéria, que se pode experimentar e manipular livremente; os fenômenos espíritas repousam na ação de inteligências dotadas de vontade própria e que nos provam a cada instante não se acharem subordinadas aos nossos caprichos. As observações não podem, portanto, ser feitas da mesma forma; requerem condições especiais e outro ponto de partida. Querer submetê-las aos processos comuns de investigação é estabelecer analogias que não existem.” (Allan Kardec, 1857).

Aqui há um paralelo fenomenal entre Ciência normal e Ciência paradigmática:

“O Espiritismo é o resultado de uma convicção pessoal, que os cientistas, como indivíduos, podem adquirir abstração feita da qualidade de cientistas. Pretender deferir a questão à Ciência equivaleria a querer que a existência ou não da alma fosse decidida por uma assembleia de físicos ou de astrônomos. ... Vedes, portanto, que o Espiritismo não é da alçada da Ciência. ... Quando as crenças espíritas se houverem divulgado, quando estiverem aceitas pelas massas humanas (e, a julgar pela rapidez com que se propagam, esse tempo não vem longe), com elas se dará o que tem acontecido a todas as idéias novas que encontraram oposição: os cientistas se renderão à evidência”. (Allan Kardec, 1857).

De fato, segundo Kunh, a vitória do paradigma concorrente se dará quando a maioria dos cientistas se converterem e aceitarem que ele é a melhor representação da realidade. (KUHN, 1962)


Conclusão


Por tudo que vimos nos parágrafos anteriores podemos concluir que Kardec tinha um conhecimento epistêmico sofisticado, fez ao mesmo tempo Ciência normal e Ciência revolucionária, percebeu que a nova ciência quebrava os paradigmas materialistas, usou os métodos tradicionais das ciências materialistas, criou novos métodos e nomenclatura, fez pesquisa de campo, utilizou uma escrita racional/acadêmica e tinha total consciência que essa nova ciência ainda não havia sido reconhecida pelos acadêmicos de sua época. (Lima, 2019). E ainda empregou técnicas discutidas na construção de uma ciência hermenêutica (SAMAIO, 2014). Dessa forma, não nos resta outra opção a não ser concluir que, sim, o trabalho de Allan Kardec pode ser considerado genuinamente científico. Afirmar isso, não implica necessariamente dizer que todas as suas teorias e conclusões são verdadeiras ou finais, pois ele próprio afirma que "se um dia a ciência provar que o espiritismo está errado, deveremos ficar com a ciência.” (KARDEC, 1857). Não significa nem mesmo dizer que tudo que ele tenha produzido a partir daí, a saber, uma nova filosofia espiritualista com consequências morais (KARDEC, 1859), tenha que ser incorporado à categoria de disciplina científica.

Que fique claro que aqui tratamos dos fenômenos, das metodologias e de epistemologia e deixamos de fora as conotações morais e éticas que seu trabalho desaguou.

Após mais de um século e meio, apesar dos avanços tecnológicos e das diversas pesquisas realizadas, o espiritismo ainda não saiu do status de ciência revolucionária. Discutir esse viés não foi o objetivo desse trabalho e exigiria uma vasta gama de observações e análises adicionais. Finalizo dizendo que Kardec abriu o caminho; cabe a nós, então, trilhá-lo, preencher as lacunas e caso a verdade esteja de fato do nosso lado, ganharmos a batalha paradigmática contra o materialismo.



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